terça-feira, dezembro 05, 2006

Simpósio Sério


Que nome se dá a um conjunto de pessoas que, apesar de defenderem ideias semelhantes, discordam pelo simples prazer de discordar? Depende, se forem políticos, a ter esse comportamento, chamamos Assembleia Parlamentar. Se forem o senhor Zé e a dona Maria dizemos que é, simplesmente, um “pé-de-vento” ou “peixeirada”. Dado que nós, arqueólogos e aspirantes, estamos a meio caminho entre estas duas realidades, a essa actividade damos vários nomes: simpósio, congresso, reunião científica, etc.
Independentemente do nome que se lhe dê todos eles, da "peixeirada" à Assembleia Parlamentar, têm dois pontos em comum: teimosia obstinada e violenta troca de insultos. Isto falando em termos gerais! Felizmente que, volta e meia, esta discussões são conduzidas com civilidade. Claro que este milagre tem a mesma frequência do cometa Halley, de 75 em 75 anos. Visto que tive o privilégio de presenciar um destes fenómenos, não creio viver para ver outro. O mesmo se pode dizer de todos os que tiveram presentes no Simpósio: “A costa portuguesa no panorama da rota atlântica durante a época romana”, que decorreu nos dias 16 e 18 de Novembro no Auditório Municipal de Peniche. É verdade meu senhores este foi um Simpósio civilizado! Diria mais, estava-se ali numa saudável troca de ideia e exposição de trabalhos!
Embora tal comportamento só dignifique a profissão, também entristece alguns. Nomeadamente os membros da Associação dos Amigos do Óscar, a facção de contra-cultura dentro da GPES. Como presidente da AAÓ esperava ver, no Simpósio, uma monumental e apocalíptica confusão. Um arraial digno de fazer corar a mais brejeira das peixeiras da Nazaré! Porém não se passou nada disso! Está mal! Vai uma pessoa, cheia de boa fé, para ver um grau de belicismo capaz de assustar o mais endurecido lutador de wrestling (está bem que aquilo não passa de teatro, com um pouco menos de texto e mais bordoada) e nada!
AAÓ ainda tentou avacalhar a coisa mas foi infrutífero. Qual era o nosso plano? Nós queríamos pegar nas pequenas ânforas, que eram dadas à entrada, e colocar aquilo ao pescoço com vinho lá dentro. Assim cada vez que um conferencista fosse falar, nós levantávamo-nos e brindávamos. Até chegamos a fazer rolhas para as ânforas! Porém esquecemo-nos de um pequenino pormenor, por muito bem feitas que estivessem as reduzidas réplicas (e estavam muito bem feitas) faltava-lhe algo: isolamento. Aquilo, obviamente, não fora feito para levar líquidos, por isso não tinha sido impermeabilizado! Por esta razão, o que sucedeu foi que, uma vez cheias, as ânforas manchavam todo o que tocassem!
Rapidamente os voluntários à experiência foram demovidos. Quer fosse por não quererem apresentar-se diante dos outros arqueólogos com um pungente cheiro a vinho (o que não seria o melhor para a sua carreira), quer fosse por não desejarem arruinar uma peça de roupa, todos se recusaram a levar, no dia seguinte, as ânforas cheias!
Contudo não se pense que a AAÓ desistiu! Podíamos não levar o vinho mas, com mil raios (Eu sei é patético! Devia por aqui um palavrão como deve ser! Mas depois teria um batalhão de gente à perna!), levamos as ânforas! Lá estávamos nós, uma série de membros do Clã dos Cortiçais (muitos deles associados da AAÓ), com ânforas ao pescoço, como se fossemos alguma espécie de gang rapper de arqueólogos. Isto no dia em que a maior parte dos conferencistas falaram das cerâmicas no contexto da rota atlântica.
Seria de esperar que isso nos valesse alguma confusão, mas nada! Nem uma boca (o que, por vezes, basta para começar uma animada discussão) nem, sequer, um franzir de sobrolho. Ninguém fez escândalo! Digo-vos foi de partir o coração! Espero que este profissionalismo não venha a ser imitado nos próximos 75 anos.

Presidente da AAÓ (enfrascando-se num tasco, consumido pela desilusão).