Mar Revolto
“Então o que me diz deste tempo?” é uma daquela frase que utilizamos quando não temos mais tema para diálogo. A chamada conversa fia! Small Talk, para os americanos. Porém esta frase da “conversa pequena” tem muito que se lhe diga hoje em dia, porque, realmente, nas últimas semana o tempo tem dado muito que falar.
No nosso país tão desabituado a grandes temporais e sem infra-estruturas para eles tem havido um pandemónio por todo o lado. Desde autocarros com crianças a serem arrastados pelas águas até barcos atirados para a praia, passando pelo impressionante fenómeno dum Leiria tornada em Veneza. Situações que nos impressionam, embora os sobreviventes de New Orleans olhem para nó de nariz empinado enquanto comentam: “Chama a isso inundações? Puf, tenrinhos!”
“Mas o que é que isto tem haver com arqueologia subaquática em geral e com os Cortiçais em particular?” perguntarão. Bem não é difícil de ver a ligação, afinal nós, os insanos pelintras da arqueologia subaquática, trabalhamos, na maior parte dos casos, sobre o resultado do mau tempo. Querem melhor maneira de afundar um navio?
Terá sido o mau tempo o que provocou o naufrágio da embarcação dos Cortiçais? Na realidade talvez nunca viremos a saber. Porém temos a certeza que os materiais sobreviventes passaram por muitos temporais ao longo dos seus 2000 anos de “residência” subaquática. Com é provado pelo mau estado em que se encontram! Não fosse o sítio torna-se numa autêntica máquina de lavar, em centrifugação máxima, mal o mar se agita! Alguns dos trabalhadores dos Cortiçais já tiveram a possibilidade de sentir na pele este fenómeno.
À medida que ouço relatos de mau tempo por todo o país não consigo evitar pensar que se estivesse a mergulhar nos Cortiçais levariam um dos maiores ensaios de porrada da minha vida! O que, na verdade já, aconteceu visto eu ter sido um dos idiotas que numa manhã da campanha de Maio de 2005 concordara em ir à água.
Os meus companheiros de crime (querendo crime, neste contexto, dizer: “acto de imensa estupidez na execução de um exercício de inútilidade”) foram a célebre Dr. Bombico (autora do post anterior) e Dr. Pedro Almeida. Se há primeira se compreende a loucura, visto ser uma arqueóloga e, como tal, ter pouco ou nenhum juízo, ao segundo esperava-se um pouco mais de bom senso. Afinal um antropólogo deveria ter parco desejo de se juntar aos seus objectos de estudo: os esqueletos.
Seja como for lá fomos nós, incutidos da missão de fazer medições entre os spits (na altura ainda não tinham sido feitas as medidas ou, sequer, instalado todos os spit hoje existentes). Naquele dia (não me perguntem quando pois já não me lembro) o mar estava só um bocadinho agitado, o que não nos preocupou por aí além. “São só uma onditas” pensamos. Porém, debaixo de água, as coisas não eram tão simples como isso.
Assim que saímos do barco e submergimos apercebemo-nos que o trabalho não ia ser assim tão simples. A visibilidade era má (embora já tivéssemos tido mergulhos piores, em que se conseguíssemos ver dois palmos à frente do nariz já jubilava-mos de alegria!), derivado ao facto da agitação levantar areia e demais “coisas” que, doutro modo, estariam sossegadinhas no fundo do mar. Contudo era a própria agitação o nosso maior problema. Ora nos empurrava de um lado para o outro suavemente ora nos lançava, quando menos esperávamos, com mais violência e com uma astúcia digna de um vietcong.
Parecíamos os Três Estarolas! Embatíamos uns nos outros e agredíamo-nos à base de barbatana, à medida que tentávamos afastarmo-nos e ganhar alguma estabilidade. Nesta secção Dr. Bombico ganhava aos ponto, visto conseguir dar a barbatana com um agressividade capaz de rivalizar com Bruce Lee.
Quando finalmente conseguíamos afastarmo-nos o suficiente uns dos outros (não muito ou perdíamos o contacto visual) éramos forçados a agarrar-nos às rochas de todos os modos possíveis e imaginário. Tudo feito com o simples fim de nos reunirmos para decidir como iríamos executar a nossa missão. Porque é que não nos limitávamos a emergir? Primeiro não era garantia que a nossa pequena reunião corresse melhor à superfície e em segundo uma das regras do mergulhador é que: os problemas que surgem debaixo de água (excepto óbvias excepções) resolvem-se debaixo de água.
Claro que a nossa tentativa de imitar lapa não foi tão fácil como se pensaria. Por exemplo, lembro-me de ser afastado da rocha, a que me tentava segurar, só para depois ser atirado contra ela com autoridade, pelas ondas. O processo tornou-se mais “agradável” por só o meu joelho direito se colocar entre a totalidade do meu peso, aliado à força marina, e a rocha. O embate foi tremendo, pelo menos para mim, já que a rocha não se queixou. Enquanto eu a única coisa que tive a presença de espírito para fazer foi proferir um forte insulto, a ninguém em particular (mencionaria qual foi mas o cibernauta já deve desconfiar).
Após um combate épico lá nos conseguimos reunir. A sério foi um combate épico! Não estou a exagerar! Noutra época teriam escrito baladas a elogiar-nos! Pronto, não acreditem!
Seja como for lá nos reunimos e começamos a fazer a primeira medição. Depois dessa tínhamos mais dez para fazer. Quantas fizemos? Bem… só mais uma. O que já foi bem bom, dadas as circunstâncias! Enquanto eu batalhava com a parte da fita métrica (ao ponto de desenvolver por ela um ódio de morte), o Pedro segurando-a a outra ponta ao spit (fazia-o prendendo-se, com as pernas, à pedra do spit, numa posição que o faziam parecer um autêntico cowboy) e a Dr. Bombico tentava ajudar os dois, enquanto se ria a bandeiras despregadas.
Finalizado o trabalho (ou pelo menos o ar e o tempo) e acabados de subir para o barco, só nos resta rir-nos das nossas figuras. Quando nos perguntavam porque é só tirarmos duas medições arranjamos uma desculpa perfeitamente plausível. Afirma-mos que tínhamos defrontado com Tubarão monstruoso, cujo só o olho era do tamanho de duas mãos abertas. Tudo isto regado com vários pormenores do nosso titânico combate com o peixe pré-diluvial. Não creio que o pessoal tenha acreditado na História…
No nosso país tão desabituado a grandes temporais e sem infra-estruturas para eles tem havido um pandemónio por todo o lado. Desde autocarros com crianças a serem arrastados pelas águas até barcos atirados para a praia, passando pelo impressionante fenómeno dum Leiria tornada em Veneza. Situações que nos impressionam, embora os sobreviventes de New Orleans olhem para nó de nariz empinado enquanto comentam: “Chama a isso inundações? Puf, tenrinhos!”
“Mas o que é que isto tem haver com arqueologia subaquática em geral e com os Cortiçais em particular?” perguntarão. Bem não é difícil de ver a ligação, afinal nós, os insanos pelintras da arqueologia subaquática, trabalhamos, na maior parte dos casos, sobre o resultado do mau tempo. Querem melhor maneira de afundar um navio?
Terá sido o mau tempo o que provocou o naufrágio da embarcação dos Cortiçais? Na realidade talvez nunca viremos a saber. Porém temos a certeza que os materiais sobreviventes passaram por muitos temporais ao longo dos seus 2000 anos de “residência” subaquática. Com é provado pelo mau estado em que se encontram! Não fosse o sítio torna-se numa autêntica máquina de lavar, em centrifugação máxima, mal o mar se agita! Alguns dos trabalhadores dos Cortiçais já tiveram a possibilidade de sentir na pele este fenómeno.
À medida que ouço relatos de mau tempo por todo o país não consigo evitar pensar que se estivesse a mergulhar nos Cortiçais levariam um dos maiores ensaios de porrada da minha vida! O que, na verdade já, aconteceu visto eu ter sido um dos idiotas que numa manhã da campanha de Maio de 2005 concordara em ir à água.
Os meus companheiros de crime (querendo crime, neste contexto, dizer: “acto de imensa estupidez na execução de um exercício de inútilidade”) foram a célebre Dr. Bombico (autora do post anterior) e Dr. Pedro Almeida. Se há primeira se compreende a loucura, visto ser uma arqueóloga e, como tal, ter pouco ou nenhum juízo, ao segundo esperava-se um pouco mais de bom senso. Afinal um antropólogo deveria ter parco desejo de se juntar aos seus objectos de estudo: os esqueletos.
Seja como for lá fomos nós, incutidos da missão de fazer medições entre os spits (na altura ainda não tinham sido feitas as medidas ou, sequer, instalado todos os spit hoje existentes). Naquele dia (não me perguntem quando pois já não me lembro) o mar estava só um bocadinho agitado, o que não nos preocupou por aí além. “São só uma onditas” pensamos. Porém, debaixo de água, as coisas não eram tão simples como isso.
Assim que saímos do barco e submergimos apercebemo-nos que o trabalho não ia ser assim tão simples. A visibilidade era má (embora já tivéssemos tido mergulhos piores, em que se conseguíssemos ver dois palmos à frente do nariz já jubilava-mos de alegria!), derivado ao facto da agitação levantar areia e demais “coisas” que, doutro modo, estariam sossegadinhas no fundo do mar. Contudo era a própria agitação o nosso maior problema. Ora nos empurrava de um lado para o outro suavemente ora nos lançava, quando menos esperávamos, com mais violência e com uma astúcia digna de um vietcong.
Parecíamos os Três Estarolas! Embatíamos uns nos outros e agredíamo-nos à base de barbatana, à medida que tentávamos afastarmo-nos e ganhar alguma estabilidade. Nesta secção Dr. Bombico ganhava aos ponto, visto conseguir dar a barbatana com um agressividade capaz de rivalizar com Bruce Lee.
Quando finalmente conseguíamos afastarmo-nos o suficiente uns dos outros (não muito ou perdíamos o contacto visual) éramos forçados a agarrar-nos às rochas de todos os modos possíveis e imaginário. Tudo feito com o simples fim de nos reunirmos para decidir como iríamos executar a nossa missão. Porque é que não nos limitávamos a emergir? Primeiro não era garantia que a nossa pequena reunião corresse melhor à superfície e em segundo uma das regras do mergulhador é que: os problemas que surgem debaixo de água (excepto óbvias excepções) resolvem-se debaixo de água.
Claro que a nossa tentativa de imitar lapa não foi tão fácil como se pensaria. Por exemplo, lembro-me de ser afastado da rocha, a que me tentava segurar, só para depois ser atirado contra ela com autoridade, pelas ondas. O processo tornou-se mais “agradável” por só o meu joelho direito se colocar entre a totalidade do meu peso, aliado à força marina, e a rocha. O embate foi tremendo, pelo menos para mim, já que a rocha não se queixou. Enquanto eu a única coisa que tive a presença de espírito para fazer foi proferir um forte insulto, a ninguém em particular (mencionaria qual foi mas o cibernauta já deve desconfiar).
Após um combate épico lá nos conseguimos reunir. A sério foi um combate épico! Não estou a exagerar! Noutra época teriam escrito baladas a elogiar-nos! Pronto, não acreditem!
Seja como for lá nos reunimos e começamos a fazer a primeira medição. Depois dessa tínhamos mais dez para fazer. Quantas fizemos? Bem… só mais uma. O que já foi bem bom, dadas as circunstâncias! Enquanto eu batalhava com a parte da fita métrica (ao ponto de desenvolver por ela um ódio de morte), o Pedro segurando-a a outra ponta ao spit (fazia-o prendendo-se, com as pernas, à pedra do spit, numa posição que o faziam parecer um autêntico cowboy) e a Dr. Bombico tentava ajudar os dois, enquanto se ria a bandeiras despregadas.
Finalizado o trabalho (ou pelo menos o ar e o tempo) e acabados de subir para o barco, só nos resta rir-nos das nossas figuras. Quando nos perguntavam porque é só tirarmos duas medições arranjamos uma desculpa perfeitamente plausível. Afirma-mos que tínhamos defrontado com Tubarão monstruoso, cujo só o olho era do tamanho de duas mãos abertas. Tudo isto regado com vários pormenores do nosso titânico combate com o peixe pré-diluvial. Não creio que o pessoal tenha acreditado na História…
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