quinta-feira, abril 19, 2007

O suspeito do costume


Este é, provavelmente, o mais suspeito dos habitantes dos Cortiçais. Suspeito do quê? De toda e qualquer coisa. É um animal que simplesmente não consegue evitar ter um ar culpado. Este crustáceo é o equivalente subaquático do “mangas”, um pequeno vigarista/vendedor de cenas fanadas/“pilha galinhas”. Se fosse humano só teria um trabalho honesto para depois roubar a caixa-registradora. Alguém que se o acusar-mos de ser capaz de vender a própria mãe ele responde: “Isso é uma proposta? O modelo inteiro ou peças? Para embrulhar ou vai mesmo assim”, para depois, claro, ficar com o dinheiro e “esquece-se” de entregar a velha.
Refiro-me ao caranguejo. Poderá ser preconceito, o mais certo é ser um invertebrado perfeitamente honesto (se é que podemos aplicar esta característica a um animal) contudo olhamos para os seus pequenos olhos separados, no topo da cabeça, e de imediato concluímos: “ou já a fez ou está par a fazer”!
Por que será? O que é que lhe dá um ar tão acusável? Será o facto de andar de lado? Afinal é um pormenor bastante específico que, certamente, levanta suspeita entre os demais formas de vida submarinas. Se a isto acrescentarmos a sua tendência para esconder-se em buracos escuros com o aproximar de alguém e os seus maneirismos de fumador compulsivo (a constante ascensão das pinças à boca dão a ideia de estar a fumar dois cigarros), dá-lhe um aspecto de vendedor ilegal, que aparece para mostrar o produto e depois evapora-se (não quero com isto dizer que todos os fumadores tenham um ar suspeito! Mas convínhamos, a imagem que Hollywood e companhia passam é que vigarista de bairro que é vigarista de bairro tem um tipo de nervosismo que só é tratado com constante assimilação de nicotina).
Talvez seja o facto de andar no mar da mesma maneira que anda em terra. Esta dubiedade levanta, seguramente, desconfianças. O simples facto de ele andar, quando os demais membro da comunidade subaquática nadam...
Independentemente do motivo o caranguejo é suspeito! Por vezes, enquanto trabalhos, damos por ele a observar-nos atentamente. Nessas alturas esperamos que, a qualquer momento, ele olhe para um lado, olhe para o outro (o que não deve ser fácil quando nos deslocamos de lado) e diga-nos: “Pst! Oh, chefe, tá interessado numas cerâmica? Consigo-as baratinhas!” Atitude para qual seria necessária uma certa dose de coragem, especialmente, tendo em conta que a uns meros 50 metros, alguns membros da sua família estão a ser cozidos vivos numa marisqueiro (que apesar das indirectas ainda não avançou com um patrocínio para ser referida aqui).

Presidente da AAÓ.